Auto-Financiamento das Sociedades por Quotas e Anónimas no Âmbito da Lei do Investimento Privado
O auto-financiamento é um tema essencial para compreender a estrutura financeira das empresas, em especial das Sociedades por Quotas (SQ) e das Sociedades Anónimas (SA), no contexto da Lei do Investimento Privado (LIP). Esse modelo de financiamento envolve a utilização de recursos próprios dos sócios para sustentar as operações e o crescimento de uma sociedade, diferindo do hetero-financiamento, que se baseia em crédito externo ou empréstimos.
1. Entradas de Capital e Constituição da Sociedade
As contribuições iniciais dos sócios representam as entradas de capital e formam o alicerce financeiro da empresa. Elas podem ser realizadas em dinheiro ou em espécie (bens avaliáveis em valor monetário), mas não em trabalho ou serviços. O capital social corresponde à soma dessas entradas e constitui o ponto de partida para o desenvolvimento do negócio.
No caso das Sociedades por Quotas, não existe um capital social mínimo obrigatório, e as entradas podem ser diferidas por até um ano. Já nas Sociedades Anónimas, até 70% do capital subscrito pode ser diferido, devendo existir um prazo máximo de um ano para sua realização.
2. Prestações Suplementares
As prestações suplementares são contribuições em dinheiro adicionais feitas pelos sócios, sem direito a juros, e aplicam-se exclusivamente às Sociedades por Quotas. Elas servem como um reforço temporário de capital, melhorando a saúde financeira da empresa e reforçando sua imagem perante credores e investidores.
Para que essas prestações sejam válidas, o contrato social deve indicar o montante máximo, os sócios obrigados e o critério de repartição. A Assembleia Geral (AG) define, por deliberação simples, o valor e a data de pagamento. Caso o contrato não preveja essa obrigação, os sócios podem aprová-la, mas ela só vincula aqueles que votaram a favor.
3. Prestações Acessórias
As prestações acessórias abrangem obrigações diversas — como a entrega de bens, prestação de serviços ou empréstimos — e podem ocorrer tanto em SQ como em SA. Essas obrigações não acompanham automaticamente a transferência de quotas ou ações, salvo acordo expresso.
Diferente das suplementares, as acessórias podem ser remuneradas e, dependendo da natureza, classificadas no balanço como ativo ou passivo. Quando implicam reembolso, figuram no passivo; caso contrário, podem constar no ativo, representando uma contribuição de valor não financeiro à sociedade.
4. Suprimentos: Financiamento Interno de Longo Prazo
Os suprimentos são uma forma de financiamento interno em que o sócio empresta dinheiro ou bens fungíveis à sociedade por um período mínimo de um ano. Essa modalidade é comum tanto em SQ quanto em SA e pode ou não gerar juros. Os suprimentos são registrados como passivo e representam um compromisso de devolução futura.
Para serem reconhecidos como válidos, devem estar formalizados em contrato escrito ou em deliberação da Assembleia Geral aprovada pelo sócio que se compromete a realizá-los. Os juros gerados por esses empréstimos estão sujeitos ao Imposto de Aplicação de Capitais.
5. Reembolso e Expatriação de Investimentos
O reembolso dos investimentos segue regras específicas da LIP. As entradas de capital não são reembolsáveis, salvo em caso de dissolução da sociedade. Já as prestações suplementares e acessórias só podem ser reembolsadas se houver lucros suficientes e aprovação em Assembleia.
Quanto aos suprimentos, o reembolso é possível após três anos, independentemente de lucros, desde que cumpridos os requisitos legais. Em casos de investimento externo, é necessária a autorização do Banco Nacional de Angola (BNA) para a expatriação dos valores e apresentação de demonstrações financeiras auditadas.
Conclusão
O auto-financiamento é um instrumento estratégico que garante autonomia e estabilidade financeira às empresas. Ele reduz a dependência de crédito bancário e fortalece a estrutura patrimonial, permitindo maior liberdade de gestão. A correta aplicação das normas da Lei do Investimento Privado assegura que essas operações ocorram de forma transparente, sustentável e conforme as exigências fiscais e legais do país.
